Um movimento surgido recentemente e que ganhou bastante força no segmento evangélico no final dos anos 1990 já começa a dar sinais de exaustão. É a chamada Igreja Emergente, anunciada por seus adeptos como uma espécie de resposta do Cristianismo pós-moderno a questões que há muito inquietam o povo de Deus, como “O que é ser cristão?”, “Qual a função da Igreja?” ou “O que significa fazer missão no mundo hoje?”. Depois de multiplicar-se pelo mundo principalmente pela via virtual, através de sites e blogs, o movimento chega à adolescência sem conseguir suprir as expectativas de alguns de seus mais entusiastas defensores. E ainda tem sido apontado como um caminho tortuoso que pode levar à secularização da fé e ao relativismo dos valores bíblicos. Há quem fale até numa “Nova Era” disfarçada. Em 31 de outubro do ano passado, o Conselho de diretores da Emergent Village, o guarda-chuvas que abriga o movimento, resolveu afastar seu líder, o pastor Tonny Jones. A decisão leva em conta o desejo de a organização manter seus propósitos originais, ou seja, a descentralização. A Igreja Emergente começou com um grupo de amigos que começaram a se reunir nos anos 1990, desiludidos com as instituições eclesiásticas tradicionais do século 20. Para eles, a vivência do Evangelho, desgastada pela suposta massificação das grandes igrejas, precisaria ser retomada informalmente, exatamente como ocorre numa conversa entre amigos. Com o tempo, outras pessoas se juntaram ao grupo. O movimento cresceu a ponto de gerar livros, eventos, sites e blogs. Em 2001, foi cunhada a expressão Igreja Emergente, já como contraposição ao chamado sistema eclesiástico. A mais marcante característica do movimento, sem dúvida, é a ênfase na vida comunitária. Por mais que reproduzir o ambiente em que se consolidou a Igreja Primitiva do primeiro século seja uma utopia perseguida de tempos em tempos pelos evangélicos, a Igreja Emergente surgiu com uma proposta nesta linha. “Os relacionamentos são muito valorizados entre nós”, destaca o pastor Sandro Baggio, dirigente do Projeto 242, uma iniciativa bem original que vem sendo desenvolvida em São Paulo há mais de dez anos. O grupo começou da mesma forma que os emergentes americanos, capitaneados pelo pastor Brian McLaren: um grupo de amigos se reuniu para buscar a Deus, mais gente se interessou e logo o espaço não suportou mais a quantidade de pessoas. Comportamentos heterodoxos – No exterior, existem igrejas que se denominam emergentes simplesmente porque adotam comportamentos heterodoxos, como velas nos cultos, cântico de músicas não-evangélicas e bate-papos sobre as coisas de Deus, no lugar das tradicionais pregações. E são estas inovações, e principalmente o que estaria por trás delas, que estão na raiz de boa parte dos detratores do movimento. “A onda emergente tem um caráter ecumenista, despreza as diferenças doutrinárias”, critica a escritora e teóloga pentecostal Mary Schultze. Segundo ela, a Igreja Emergente é filiada ao Movimento de Crescimento da Igreja. “Eles pregam o misticismo”, aponta. Mas para o pastor Baggio, o conceito de Igreja Emergente é muito maior do que isso. “Ela seria o lugar para quem está cansado da metodologia das igrejas atuais e quer buscar alternativas”, define. Para os emergentes, o rótulo não importa muito. “Não é esse reconhecimento que move as pessoas envolvidas com essa tendência, mas sim um desejo sincero de viver e comunicar a fé cristã neste mundo em transição”, explica. Segundo ele, o movimento no Brasil ainda não é forte. Entretanto, algumas ações dispersas pelo país começam a ser conhecidas, como a La Red del Camiño, que atua no sul do país, e o Tribal Generation, que já realizou várias conferências. “O que existe são pessoas em vários lugares que se interessam pelo tema e buscam saber do que se trata. As igrejas emergentes são mais famílias do que instituições, mais comunidades do que ajuntamentos”, conclui o dirigente. Líder da Organização Palavra da Vida, em São Paulo, o pastor Carlos Oswaldo diz que os princípios defendidos pela Igreja Emergente não são novos. “Algumas das propostas gerais do movimento já foram recicladas algumas vezes nos últimos 40 anos”, destaca. Ele preocupa-se com alguns métodos utilizados pelo grupo para a consecução de suas metas – inclusive, muitas concessões ao pensamento pós-modernista. “Alguns dos propagadores do movimento adotam uma atitude que poderia ser chamada de ‘agnosticismo evangélico’, por mais contraditória que seja esta expressão”, critica.“A Igreja Emergente terá pontos positivos se for considerada apenas como um movimento não institucionalizado, sem pretensão de oferecer respostas prontas ou apresentar novas verdades”, emenda, por sua vez, o pastor Ed René Kivitz, líder da Igreja Batista de Água Branca, em São Paulo. Ele reconhece a simpatia que tem pelo movimento, mas lembra que prefere o contexto da teologia latino-americana, na qual tem caminhado. Para Kivitz, a plataforma de idéias que embasam essa corrente eclesiástica deve evitar as soluções aparentemente muito naturais, na base do modismo ou de receitas de “como fazer”. “Cansados” – O administrador Luís Fernando Batista, gestor do site Renovatio Café, que divulga conteúdo ligado ao movimento, ressalta que a Igreja Emergente não deve ser usada como pretexto para que o crente não se envolva com uma igreja local. “Muitos que falam sobre o movimento não têm nenhum envolvimento efetivo com a missão e agem somente por mágoas com alguma igreja tradicional, o que desencadeia observações equivocadas”, observa. “São apenas simpatizantes de qualquer coisa evangélica fora do modelo de igreja tradicional, do qual se dizem cansados”. Batista conta que viu no site de uma igreja nos Estados Unidos o anúncio da realização de três cultos no domingo pela manhã: o primeiro, tradicional, com hinário e órgão; o segundo, com enfoque contemporâneo, com apresentações em PowerPoint e dramatizações. O terceiro era o culto emergente, com velas e rock alternativo. “Congregações que fazem questão de se apresentar como emergentes querem se colocar assim para apresentar-se como as igrejas que têm a novidade do momento.”Todavia, ele aposta que surgirá em breve uma geração pós-evangélica que vai rejeitar a igreja sem abandonar o respeito à pessoa de Jesus. “É para atuar nessa área que surgem movimentos revolucionários, não preocupados apenas em mudar a forma da igreja, mas em deixar a marca de Cristo na sociedade.” Para Sandro Baggio, o desafio do movimento emergente é passar do estágio inicial, no qual, acredita, ainda se encontra. “A Igreja Emergente precisa passar da fase da desconstrução para a etapa da edificação”, assinala. Já o pastor Dan Kimball, outro líder dessa maneira alternativa de se fazer igreja, prefere nem usar mais a terminologia do movimento. Por esta razão, ele e o professor Scot McKnight formaram uma nova rede, provisoriamente chamada de Origins (origens). Em sua opinião, a Igreja Emergente desenvolveu-se em muitas vertentes teológicas. “A definição do que é ser emergente mudou”, sustenta. “Entretanto, continuarei defendendo e trabalhando pelos ideais da Igreja Emergente, pois ela representa evangelismo e missão para a nova geração que surge.”
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